segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

sobre a amizade (II)

ser amigo é algo que envolve funções muito específicas: não se trata apenas de babar ovo, colocar apelidos carinhosos e concordar em assistir "amanhecer" na sexta-feira à noite, apesar dos convites pro bar, e outros free-tudo pela cidade. às vezes, é também abrir a boca, em meio a uma aula na escola de medicina, olhar para o lado e perguntar àquela velha companheira, se há algum grau de percepção de realidade nela que vá além dos compêndios. tudo bem que seja divertido dirigir em alta velocidade, amiga, mas eu não vou deixar você entrar num racha só porque para você, a adrenalina precisa subir para a cabeça funcionar melhor. vem meio daquela noção de que somos responsáveis pelo que cativamos, que não é só tratar bem, mas dar um puxão de orelha e dizer: cara, sua alma é tão podre, mas tão podre que nem mesmo o diabo compraria ela. por mais que pra você pareça engraçado, o dolo que você causa nos outros seres humanos ainda me lembra a alemanha com seus judeus - só que muito mais cru, em termos emocionais. é que acontece do meu lado, júlia, e eu ainda consigo ver você sugando a pureza da minha alma, só porque te ouço defender esse ponto de vista, essa barbaridade, e finjo que não sei resolver (e vou enganando, assim, ao menos, a minha própria alma). que não me vejam ao seu lado nessa hora, amigo, eu continuarei eternamente seu seguidor. até que me digam "e como anda a brancura da sua", e eu o empurre, dizendo que as manchas em minha alma são seus pedidos de ajuda. - pária! mas eu volto, logo quando todos virarem o rosto. amigo é assim. 

eu imagino: um amigo que permite que as ações do outro o encaminhe ao inferno, um homem que se aproxima de uma alma covarde e, por covardia (eu só não posso perder meu amigo), silencia frente às suas ações, quão deturpada é a sua mente? quão importa, ao longo de uma amizade, as descobertas do tipo 'ela cometeu assassinato antes de vir para a cidade, e não a pegaram', ou 'ela machuca animaiszinhos', 'ela veste roupa de pele'. será que numa amizade, não mudam os conceitos sobre as pessoas? ou talvez eles mudem, mas sejam sustentados enquanto iguais, afinal, tratamos aqui de humanóides em sociedade. 

eu só espero, júlia, que um dia você de fato tenha um amigo para apontar esse macaco atrás de você, e rindo da sua cara, diga: - o mago é ele, você é apenas um tolo. (e em, especial, júlia, eu espero que ainda te apontem dizendo: sua alma é suja.)

memória de vida passada em signisciência